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25 maio 2015

Institutas 32

“… Tampouco é minha intenção – segundo já disse – citar todos os textos concernentes a esse propósito [Oração], mas somente colher alguns dos mais notáveis, para que, por eles, experimentemos quão gentilmente o Senhor nos convida a si e quão estreitamente encerrada se encontra nossa ingratidão sem poder escapar, já que nossa preguiça é tanta que, estimulada por tais convites, ainda fica imóvel. Portanto, ressoem sempre  em nossos ouvidos estas palavras: 'Perto está o Senhor de todos os que o invocam, de todos os que o invocam de verdade' (Sl. 145:18)… Recebemos este fruto singular das promessas de Deus: que não fazemos nossas orações com dúvidas e de forma apática, mas confiados na Palavra daquele cuja majestade de outra maneira nos aterraria; ousamos chamá-lo Pai, uma vez que Ele tem por bem nos ordenar que o invoquemos com esse suavíssimo nome. Só resta que nós, convidados pro tais exortações, persuadamo-nos de que temos motivos de sobra para ser ouvidos, quando nossas orações não se fundamentam nem se apoiam em nenhum mérito nosso, mas toda sua dignidade e a esperança de alcançar o que pedimos descansam nas promessas de Deus e delas depende… somente tenhamos sinceridade de coração, desgosto de nós mesmos, humildade e fé, a fim de que nossa hipocrisia não profane com uma falsa invocação o nome de Deus...”
(João Calvino, Livro 3, Capítulo XX, parágrafo 14)

“… Dissemos que, ainda que a oração seja um colóquio familiar para Deus, os fiéis devem-se manter respeitosos e reverentes; não devem afrouxar as rédeas a qualquer desejo e pedir quanto se lhes ocorra, e não hão de desejar além do que Ele permite; assim, para não desprezar a majestade divina, devemos elevar ao alto nosso espírito, e, abandonando as p reocupações terrenas, honrá-lo pura e castamente. Com a integridade e a perfeição que se requer, isso não foi feito por ninguém de todos que já viveram neste mundo… E até Deus suporta nosso balbuciar e perdoa nossa ignorância e tolice quando algo se nos escapa involuntariamente; pois de fato não teríamos nenhuma liberdade para orar se Deus não condescendesse conosco…
… Ocorre-lhes o mesmo nas vezes em que seu espírito anda vagando de um lado a outro, e como que extraviado; é, pois, necessário que Deus também lhes perdoe isso, a fim de que suas orações – lânguidas, débeis e entrecortadas – não deixem de ser admitidas. Deus imprimiu naturalmente na mente dos homens o que as orações não são legítimas se nossa mente não está voltada para o alto. Daqui surgiu, como já dissemos, o gestual de alçar as mãos, que usado em todos os tempos e por todos os povos, perdura até o presente...”
(João Calvino, Livro 3, Capítulo XX, parágrafo 16)

*** Observação: O “selo” (marca) de João Calvino é representado pelo desenho de um coração na palma da mão, junto com as palavras “Eu ofereço meu coração a Ti, Senhor, pronta e sinceramente”.
(Ver história do “selo” em http://www.calvin.edu/about/history/calvin-seal.html)


“Como não há homem algum digno de apresentar-se diante de Deus, o próprio Pai celestial, para fazer-nos perder o receito e ao mesmo tempo o temor que poderia abater nosso ânimo, deu-nos seu Filho, Jesus Cristo Nosso Senhor, como Advogado e Mediador (1Tm. 2:5; 1Jo. 2:1), por cuja majestade e orientação podemos chegar ao Pai com segurança, apoiados na certeza de que coisa alguma pedida em nome do Filho nos seja negada, uma vez que o Pai nada lhe pode negar. E a isso se deve referir tudo quanto ensinamos sobre a fé até aqui. Porque, como a promessa nos mostra Jesus Cristo como nosso Mediador, se a esperança de alcançar o que pedimos não se fundamenta sobre Ele, priva-se do direito de orar. Pois, tão logo se nos apresenta a terrível majestade de Deus, não podemos senão nos aterrar, e o conhecimento de nossa própria indignidade nos rechaça muito longe, até que Jesus Cristo nos vem ao encontro para transformar o trono de glória aterradora em trono de graça, como o apóstolo nos exorta a aproximarmo-nos 'seguros e confiantes, do trono da graça, para alcançarmos misericórdia e encontrarmos a graça do socorro no momento oportuno' (Hb. 4:16)...”
(João Calvino, Livro 3, Capítulo XX, parágrafo 17)

“… E quando, em outro lugar, chama-o de único Mediador entre Deus e os homens (1Tm. 2:5), porventura não o faz tendo em conta as orações que pouco antes mencionara? Porque, depois de dizer que se deve orar a Deus por todos os homens, em seguida, para confirmar a sentença, acrescenta que há só um Deus e um só Mediador para dar o acesso a Ele por todos os homens. Não de outra forma o interpreta Agostinho quando diz: 'Os cristãos se encomendam a Deus em suas orações, rogando uns pelos outros; mas aquele por quem ninguém intercede, mas sim Ele por todos, esse é o único e verdadeiro Mediador. E o apóstolo Paulo, mesmo sendo um de seus principais membros – como era membro do corpo de Cristo e sabia que o Senhor Jesus, sumo e verdadeiro pontífice, entrara por toda a Igreja no íntimo do santuário de Deus, não em figura mas em realidade –, encomenda-se também às orações dos fiéis, e não se constitui a si mesmo mediador entre Deus e os homens, mas suplica que todos os membros do corpo de Cristo orem por ele, assim como o apóstolo ora por eles, uma vez que os membros devem preocupar-se uns com os outros e que, se um membro padece, os outros hão de padecer também com ele (Rm. 15:30; Ef. 6:19; Cl. 4:3; 1Co. 12:25). Assim, as orações de todos os membros que ainda militam na terra, e que fazem uns por outros, devem subir até a Cabeça, que lhes precedeu no céu, na qual temos a remissão dos pecados. Porque se Pedro fosse mediador, sem dúvida o seriam também os demais apóstolos; e se houvesse muitos mediadores, não estaria de acordo com o que o apóstolo diz, que há `um só Mediador entre Deus e os homens` (1Tm. 2:5), no qual nós também somos uma mesma coisa se procurarmos `guardar a unidade do Espírito no vínculo da paz` (Ef. 4:3)' [Agostinho, Contra epist. Parmeniani, II 8, 16. MSL 43,60]. De acordo com essa doutrina, ele mesmo diz sobre o salmo 94: 'Se tu buscas a teu sacerdote, está nos céus; ali ora por ti, Ele que na terra morreu por ti' [Agostinho, In. Ps., 94, 6 MSL 37, 1220s]...”
(João Calvino, Livro 3, Capítulo XX, parágrafo 20)

“No que diz respeito aos santos, que estão mortos segundo a carne e vivem em Cristo, se lhes atribuímos alguma oração, não deliremos que eles têm outro caminho de rezar a Deus que não seja Cristo, que é o único caminho; nem que suas preces sejam aceitas por Deus em nome de ninguém mais senão Cristo. Assim, pois, a Escritura nos afasta de todos os demais, para recorrermos somente a Cristo, porque o Pai celestial quer reunir nele todas as coisas. Seria uma grande tolice, para não dizer loucura, pretender ter acesso a Deus por intermédio dos santos, afastando-nos daquele sem o qual nem eles mesmos teriam acesso. E quem pode negar que isso se vem fazendo desde já muitos anos e que atualmente se pratica onde quer que vigore o papismo?… E se é chamada como testemunha a consciência daqueles que se apoiam na intercessão dos santos, veremos que isso vem unicamente de que estão perplexos, como se Cristo lhes fosse faltar ou fosse muito severo. Como semelhante perplexidade, desonram a Cristo e o despojam do título de único Mediador; honra que, por ter-lhe sido dada como prerrogativa, não se deve atribuir a ninguém mais além dele. Obscurecem assim a glória de seu nascimento, anulam sua cruz e o privam enfim da honra de tudo o que fez e padeceu; porque todas essas coisas tendem a que seja o único Mediador, e reconhecido como tal. Além disso, tampouco levam em conta a vontade de Deus, que lhes demonstra ser um Pai para eles. Porque Deus não é seu Pai se não reconhecem Cristo como irmão; o que claramente negam se não estimam que Cristo os ama com um amor fraterno e tão terno como não pode haver outro no mundo. Por isso a Escritura no-lo apresenta singularmente, a Ele nos envia e nele se detém, sem passar adiante. Diz Ambrósio: 'Ele é nossa boca, com a que falamos ao Pai; nossos olhos, com os que vemos o Pai; nossa mão direita, com a que oferecemos ao Pai; se Ele não intercedesse, nem nós, nem nenhum de quantos santos existem, teríamos acesso a Deus' [Ambrosius, De Isaac vel anima 8, 75 CSEL 32 I, 694,6]...”
(João Calvino, Livro 3, Capítulo XX, parágrafo 21)