08 julho 2025

Livro: "Um Guia para Oração" (Isaac Watts)

Tradução de alguns trechos do livro "A Guide to Prayer" ("Um Guia para Oração"), de Isaac Watts:

INTRODUÇÃO
'ORAÇÃO é uma palavra de sentido amplo nas Escrituras, e inclui não apenas um pedido ou petição por misericórdia, mas também [a oração] é entendida como o discurso de uma criatura na terra, a Deus no Céu, sobre tudo o que diz respeito a seu Deus, seu próximo ou a si mesma [criatura], neste mundo, ou no mundo vindouro. É aquela conversa que Deus nos permitiu manter consigo mesmo lá em cima, enquanto estamos aqui embaixo. É aquela linguagem pela qual uma criatura mantém correspondência com seu Criador; e pela qual a alma de um santo frequentemente se aproxima de Deus, é animada com grande deleite e, por assim dizer, habita com seu Pai celestial por um curto período [de tempo] antes de chegar ao Céu. [Oração] É um privilégio glorioso que nosso Criador nos concedeu, e uma parte necessária daquela obediência que Ele exigiu de nós, em todos os momentos e épocas, e em todas as circunstâncias da vida. De acordo com as Escrituras, 1 Tessalonicenses 5:17: “Orai sem cessar”. Filipenses 4:6: “Em tudo, pela oração e súplicas, com ações de graças, sejam os vossos pedidos conhecidos diante de Deus”. Efésios 6:18: “Orando em todo o tempo com toda a oração e súplica”. A oração é uma parte do culto a Deus, exigida para todos os homens, e deve ser realizada com a voz, ou apenas no coração, sendo chamada de oração vocal, ou [oração] mental. É ordenada individualmente às pessoas, em seus retiros privados, de uma maneira mais solene e contínua; e, em meio aos afazeres da vida, por elevações secretas e repentinas da alma a Deus. Pertence também às comunidades humanas, sejam elas naturais, como famílias; ou civis, como corporações, parlamentos, tribunais ou sociedades para comércio e negócios; e às comunidades religiosas [igrejas], quando as pessoas se reúnem para qualquer propósito piedoso, devem buscar a Deus; [oração] é requerida das igrejas cristãs, de maneira especial; pois a casa de Deus é a casa de oração. Sendo, portanto, um dever de absoluta necessidade para todos os homens [seres humanos], e de uso universal, convém que todos saibamos como cumprir [este dever] corretamente, para que se obtenha a aceitação do grande Deus, e se torne um exercício prazeroso e proveitoso para nossas almas, e para aqueles que se unem a nós. Para tanto, apresentarei [Isaac Watts] meus pensamentos sobre o assunto [oração] na seguinte ordem: Primeiro, falarei da natureza da oração como um dever de adoração. Segundo, como deve ser realizada pelos dons ou habilidades que Deus nos concedeu. Terceiro, como deve ser acompanhada pelo exercício de nossas graças. Quarto, como somos auxiliados nela pelo Espírito de Deus; e, Quinto, concluirei tudo com um sincero discurso aos cristãos, para que busquem esta sagrada habilidade de conversar com Deus.'

AS PARTES DA ORAÇÃO (Cap.1)
'No discurso da oração, considerado como um dever de adoração exigido de nós, para que possamos entender melhor toda a sua natureza, que ela [oração] seja dividida em suas várias partes; e penso que todas elas podem ser incluídas nas seguintes, a saber: Invocação, Adoração, Confissão, Petição, Súplica, Profissão ou Autodedicação, Ação de Graças e Bênção: – de cada uma das quais falarei particularmente.”'

Seção I – da Invocação (Cap.1)
'A primeira parte da oração é a Invocação, ou chamado a Deus; e pode incluir estas três coisas: 
1. Uma menção de um ou mais nomes ou títulos de Deus; e assim, por assim dizer, falamos com a pessoa a quem oramos: como você tem abundantes exemplos nas orações que nos são transmitidas na Sagrada Escritura: “Ó Senhor, meu Deus, altíssimo e santíssimo Deus e Pai. Ó Deus de Israel, que habitas entre os querubins. Deus Todo-Poderoso e Rei eterno. Pai nosso que estás nos céus. Ó Deus, que guardas a aliança”; e vários outros. 
2. Uma declaração do nosso desejo e desígnio de adorá-lo: “A ti elevamos as nossas almas; aproximamo-nos de ti, como nosso Deus. Viemos à tua presença. Nós, que somos apenas pó e cinzas, assumimos a responsabilidade de falar à tua Majestade. Nós nos curvamos diante de ti em humildes discursos”, ou algo parecido. – E aqui, talvez não seja impróprio mencionar brevemente uma ou duas expressões gerais de nossa própria indignidade. 
3. Um desejo de Sua assistência e aceitação, sob o senso de nossa própria insuficiência e indignidade, em uma linguagem como esta: “Senhor, vivifica-nos para invocar o teu nome. Auxilia-nos, pelo teu Espírito, em nosso acesso ao teu propiciatório. Eleva nossos corações a ti. Ensina-nos a nos aproximar de ti, como convém a criaturas, e aproxima-te de nós, como um Deus de graça. Ouve a voz do meu clamor, Rei meu e Deus meu, pois a ti orarei”; no Salmo 5:2, em cujas palavras você tem todas essas três partes da invocação expressas.'

Seção II – da Adoração (Cap.1)
'A segunda parte da oração é a Adoração, ou honra prestada a Deus pela criatura; e contém estas quatro coisas: 
1. Uma menção à Sua natureza, como Deus, com a mais alta admiração e reverência: e isso inclui Seus atributos e perfeições mais originais – Sua existência autossuficiente; que Ele é Deus, de si mesmo, e a partir de si mesmo. Sua unidade de essência; que não há outro Deus além de si mesmo. Sua substância inconcebível em três pessoas, o Pai, o Filho e o Espírito Santo; que o mistério da Trindade é um objeto muito próprio de nossa adoração e admiração, visto que ultrapassa em muito nossa compreensão. Sua incompreensível distância de todas as criaturas e Sua infinita superioridade de natureza sobre elas, parecem também reivindicar um lugar aqui. A linguagem desta parte da oração é assim: “Tu és Deus, e não há outro; só o teu nome é Jeová, o Altíssimo. Quem, nos céus, se pode comparar ao Senhor? Ou quem, entre os filhos dos poderosos, se pode assemelhar ao nosso Deus? Todas as nações são como nada diante de ti, e são reputadas aos teus olhos como menos do que nada, e como vaidade. Tu és o primeiro e o último, o único Deus verdadeiro e vivo; o teu Nome glorioso é exaltado acima de toda bênção e louvor.” 
2. A menção de Seus vários atributos, com as devidas expressões de louvor e com o exercício da graça e afeição adequadas: como Seu poder, Sua justiça, Sua sabedoria, Sua soberania, Sua santidade, Sua bondade e misericórdia. Uma abundância desse tipo de expressões pode ser encontrada nas Escrituras, naqueles discursos que os santos fizeram a Deus em todas as épocas. – “Tu és mui grandioso, ó Senhor, e estás revestido de honra e majestade. Tu és o bendito e único potentado, Rei dos reis e Senhor dos senhores. Todas as coisas estão desnudas e patentes diante dos teus olhos. Tu sondas o coração do homem, mas quão insondável é o teu entendimento, e o teu poder é desconhecido. Tu és tão puro de olhos, que não podes contemplar a iniquidade. A tua misericórdia dura para sempre. Tu és tardio em irar-te, abundante em bondade, e a tua verdade alcança todas as gerações”. Estas meditações são de grande utilidade no início das nossas orações, para nos humilhar perante o trono de Deus, para despertar a nossa reverência, a nossa dependência, a nossa fé e esperança, a nossa humildade e a nossa alegria.
3. A menção de suas diversas obras: da criação, da providência e da graça, com os devidos louvores. Pois, assim como Deus é glorioso em si mesmo, em sua natureza e atributos, assim também, pelas obras de Suas mãos, Ele nos manifestou essa glória, e nos convém atribuir a mesma glória a Ele — dizer-lhe humildemente o senso que temos das diversas perfeições que Ele revelou em Suas obras, em linguagem como esta: “Tu, Senhor, fizeste os céus e a terra. Toda a criação é obra de tuas mãos. Tu reinas entre os exércitos celestiais; e entre os habitantes da terra fazes o que te agrada. Tu revelaste tua bondade para com a humanidade, e magnificaste tua misericórdia acima de tudo, com o teu nome. Tuas obras da natureza e da graça são repletas de maravilhas e almejadas por todos aqueles que nelas se comprazem”. 
4. A menção de Sua relação conosco, como Criador, como Pai, como Redentor, como Rei, como amigo Todo-Poderoso e nossa porção eterna. E, aqui, não será impróprio mencionar o nome de Cristo, em, e por meio de quem somente somos aproximados de Deus, e feitos Seus filhos. Por cuja encarnação e expiação, Ele se torna Deus e Pai para os homens pecadores, e aparece como seu Amigo reconciliado. E, por este meio, nos aproximamos ainda mais de Deus em cada parte desta obra de adoração. Quando consideramos Sua natureza, nos distanciamos dEle, como criaturas [se distanciam] de um Deus [Criador]; pois Ele é infinitamente superior a nós. Quando falamos de Seus atributos, parece crescer uma familiaridade [intimidade/relacionamento] maior entre Deus e nós, enquanto lhe dizemos que aprendemos algo sobre Seu poder, Sua sabedoria, Sua justiça e Sua misericórdia. Mas, quando passamos a mencionar as diversas obras de Suas mãos, nas quais Ele se revelou sensivelmente ao nosso entendimento, parecemos nos aproximar ainda mais de Deus; e, quando finalmente podemos aflorar para chamá-lo de nosso Deus, a partir de um senso de Sua relação especial conosco, em Cristo, então ganhamos o acesso mais próximo, e estamos melhor preparados para as partes seguintes desta adoração [oração].'