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16 setembro 2014

Correr “dEle” ou “prEle” ?

Devemos correr "de Deus" ou "para Deus" ?


Correr “dEle” ou “prEle” ?

“Cantai ao SENHOR um cântico novo, cantai ao SENHOR, todas as terras.
Cantai ao SENHOR, bendizei o seu nome; proclamai a sua salvação, dia após dia.
Anunciai entre as nações a sua glória, entre todos os povos, as suas maravilhas.
Porque grande é o SENHOR e mui digno de ser louvado, temível mais que todos os deuses.
Porque todos os deuses dos povos não passam de ídolos; o SENHOR, porém, fez os céus.
Glória e majestade estão diante dele, força e formosura, no seu santuário.
Tributai ao SENHOR, ó famílias dos povos, tributai ao SENHOR glória e força.
Tributai ao SENHOR a glória devida ao seu nome; trazei oferendas e entrai nos seus átrios.
Adorai o SENHOR na beleza da sua santidade; tremei diante dele, todas as terras.
Dizei entre as nações: Reina o SENHOR. Ele firmou o mundo para que não se abale e julga os povos com eqüidade. Alegrem-se os céus, e a terra exulte; ruja o mar e a sua plenitude.
Folgue o campo e tudo o que nele há; regozijem-se todas as árvores do bosque, na presença do SENHOR, porque vem, vem julgar a terra; julgará o mundo com justiça e os povos, consoante a sua fidelidade.”
(Salmos 96, ênfases acrescentadas; ver também 1Crônicas 16:23-33)


O salmista descreve o Senhor como “temível” (verso 4) e recomenda a “todas as terras” que “tremei diante dele” (verso 9). O autor da carta aos Hebreus também exorta, dizendo “porque o nosso Deus é fogo consumidor” (Hebreus 12:29), fazendo referência ao texto de Deuteronômio (4:24): “Porque o SENHOR, teu Deus, é fogo que consome, é Deus zeloso”.
De fato, muitos ateístas e antiteístas, inclusive notoriamente conhecidos a nível mundial, usam o argumento de um deus “déspota”, “cruel”, “impiedoso” e muitos outros adjetivos que não valem a pena serem relatados aqui. Talvez esta visão distorcida do Deus bíblico seja proveniente da leitura pontual (sem considerar o contexto, e, muito menos, toda a revelação bíblica) de alguns trechos das Sagradas Escrituras, particularmente veterotestamentários.
Apesar de Deus ser realmente um “fogo consumidor” e “temível”, por causa da sua essência de Santidade, que abomina o pecado, ele também é um Deus de misericórdia e graça, e tentaremos provar este ponto de vista ao decorrer deste texto.
Poderíamos, portanto, tentar resumir a questão principal abordada aqui, em uma pergunta simples, relacionada com o Deus “temível” (de quem normalmente deseja-se afastar) e “misericordioso” (de quem normalmente deseja-se aproximar), como revelado nas Escrituras Sagradas: Devemos correr “dEle” ou “para Ele” (“prEle”) ?
O primeiro exemplo bíblico que usaremos é o famoso episódio da derrubada dos muros de Jericó, como relatado particularmente a partir do segundo capítulo do livro de Josué, no Antigo Testamento. Uma personagem importante neste relato é Raabe, que dá guarida aos “espias” de Israel. No diálogo entre eles, Raabe diz aos espias (verso 9): “Bem sei que o SENHOR vos deu esta terra, e que o pavor que infundis caiu sobre nós, e que todos os moradores da terra estão desmaiados”. Contudo, apesar de todo o temor que Raabe declaradamente sentia pelo poder de Deus nos acontecimentos públicos relatados por ela mesma (versos 10 e 11), e com todos os motivos para correr “dEle”, na verdade, ela corre “prEle”, pedindo aos espias que jurassem, “pelo Senhor”, para ter misericórdia para com ela e com sua casa (verso 12, em diante). E na continuação do relato bíblico, o leitor pode perceber que foi exatamente isso o que aconteceu com Raabe, o que também é confirmado pelo aparecimento do seu nome na descrição da genealogia de Jesus Cristo (ver Mateus 1:5).
O segundo exemplo que usaremos é do rei Davi, que depois de ter seu pecado sido exposto e confrontado pelo profeta Natã (ver 2Samuel, capítulos 11 e 12), ele clama ao Senhor por misericórdia, correndo “prEle”, como pode ser verificado no Salmo 51.
O terceiro exemplo vem dos profetas, de uma maneira geral, chamando o povo de Deus ao arrependimento e à reaproximação com Ele. Em outras palavras, os profetas exortavam o povo de Deus a correr “prEle”, e não “dEle”. Em Isaías, por exemplo, pode-se perceber este propósito no seguinte trecho das escrituras (Isaías 64:3-9, ênfases acrescentadas): “Quando fizeste coisas terríveis, que não esperávamos, desceste, e os montes tremeram à tua presença. Porque desde a antiguidade não se ouviu, nem com ouvidos se percebeu, nem com os olhos se viu Deus além de ti, que trabalha para aquele que nele espera. Sais ao encontro daquele que com alegria pratica justiça, daqueles que se lembram de ti nos teus caminhos; eis que te iraste, porque pecamos; por muito tempo temos pecado e havemos de ser salvos? Mas todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças, como trapo da imundícia; todos nós murchamos como a folha, e as nossas iniquidades, como um vento, nos arrebatam. Já ninguém há que invoque o teu nome, que se desperte e te detenha; porque escondes de nós o rosto e nos consomes por causa das nossas iniquidades. Mas agora, ó SENHOR, tu és nosso Pai, nós somos o barro, e tu, o nosso oleiro; e todos nós, obra das tuas mãos. Não te enfureças tanto, ó SENHOR, nem perpetuamente te lembres da nossa iniquidade; olha, pois, nós te pedimos: todos nós somos o teu povo”.
No próprio relato do chamamento de Isaías, encontrado no capítulo 6, ele teme diante da manifestação da Glória do Deus Santíssimo (“Santo, Santo, Santo”, verso 3): “ai de mim! Estou perdido! Porque sou homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o SENHOR dos Exércitos!” (verso 5). Contudo, apesar do temor e da provável vontade de correr “dEle”, Isaías, depois de ouvir o chamado do Senhor (verso 8), responde “eis-me aqui, envia-me a mim”, portanto correndo “prEle”.
O próximo exemplo pode ser encontrado no livro de Jonas. O próprio profeta, depois de ter corrido “dEle” (Jonas 1:3), tentando fugir para Társis, acabou correndo “prEle” (Jonas 2:1-2), de dentro “do ventre do peixe”. Ainda, no terceiro capítulo do livro, Jonas vai a Nínive, anunciando que em quarenta dias, a cidade seria subvertida (Jonas 3:1-4), mas os ninivitas (incluindo seu Rei), apesar de terem todos os motivos para correr “dEle”, “se converteram do seu mau caminho” (Jonas 3:8-10) e correram “prEle”, na esperança da Sua misericórdia, e foram poupados.
No relato bíblico do livro de Gênesis (capítulo 32), podemos citar também o exemplo de Jacó, que teve medo do seu irmão Esaú (versos 7 e 8) por causa do mau que Jacó havia feito contra ele (ver capítulo 27), e correu “prEle” em oração (capítulo 32, versos 9 a 12). Ao transpor o vau de Jaboque (verso 22), Jacó correu novamente “prEle” e não O deixou ir até que recebesse sua bênção (verso 26). Este relato é confirmado no livro de Oseias (12:2-4), onde pode ser encontrado o relato de que Jacó “pediu mercê” ao “anjo” (Oseias 12:4), que semelhantemente ao “homem” do relato de Gênesis (32:24), neste contexto, segundo os teólogos e estudiosos do texto bíblico, faz referência a presença de Deus. Portanto, Jacó correu “prEle”, confiando em Sua bênção.
Quanto aos exemplos neotestamentários, poderíamos citar vários relatos de pessoas que tinham motivos ou temores para correrem “dEle”, mas acabaram correndo “prEle”, como por exemplo, a “mulher cananéia” (Mateus 15:22-28), a “mulher samaritana” (João 4:5-42), o “publicano Zaqueu” (Lucas 19:1-10) e o próprio apóstolo Pedro, que correu “prEle” lançando-se ao mar (João 21:7), mesmo depois de ter corrido “dEle”, negando-O três vezes “antes de cantar o galo” (ver Mateus 26:34; 26:75; Marcos 14:30; 14:72; Lucas 22:34; 22:61).
Não podemos deixar de fora o exemplo do apóstolo dos gentios, proveniente de Tarso, que como Saulo correu “prEle”, perseguindo-o (“Saulo, Saulo, por que me persegues?”, Atos 9:4), mas como Paulo, correu “prEle”, glorificando-O (ver Atos 9:18-20), por exemplo, através do seu ministério missionário e das epístolas paulinas que constituem quase um quarto de todo o Novo Testamento.
Finalmente, o próprio Senhor Jesus, em momento de grande agonia, no calvário, correu “prEle”, o Deus Pai, dizendo: “Eli, Eli, lamá sabactâni? O que quer dizer: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Mateus 27:46). João Calvino, comentando este clamor de Jesus, escreve o seguinte: "O que ensina aquela celebre invocação, na qual clamou ante a violência da dor, 'Meu Deus, ó meu Deus, por que me abandonastes?' [Mateus 27:46]? Pois, ainda que sobremaneira angustiado, não deixou de chamar de seu o Deus do qual exclama estar afastado" (João Calvino, Institutas, Livro 2, cap. XVI, §12).

Obrigado, Senhor, pelo Caminho (João 14:6) que nos concede para corrermos para Ti!

“Ah! Todos vós, os que tendes sede, vinde às águas; e vós, os que não tendes dinheiro, vinde, comprai e comei; sim, vinde e comprai, sem dinheiro e sem preço, vinho e leite. Por que gastais o dinheiro naquilo que não é pão, e o vosso suor, naquilo que não satisfaz? Ouvi-me atentamente, comei o que é bom e vos deleitareis com finos manjares. Inclinai os ouvidos e vinde a mim; ouvi, e a vossa alma viverá; porque convosco farei uma aliança perpétua, que consiste nas fiéis misericórdias prometidas a Davi.” (Isaías 55:1-3, ênfases acrescentadas)
“Ora, se invocais como Pai aquele que, sem acepção de pessoas, julga segundo as obras de cada um, portai-vos com temor durante o tempo da vossa peregrinação, sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo, conhecido, com efeito, antes da fundação do mundo, porém manifestado no fim dos tempos, por amor de vós que, por meio dele, tendes fé em Deus, o qual o ressuscitou dentre os mortos e lhe deu glória, de sorte que a vossa fé e esperança estejam em Deus.” (1Pedro 1:17-21, ênfases acrescentadas)