Print Friendly and PDF

04 dezembro 2019

Pensamento em citação 52

Carlos Chagas Filho
(Importante cientista: médico)

"Estou procurando mostrar que não há incompatibilidade entre a verdade científica e a revelação: são duas coisas que tratam de espaços diferentes. Uma trata da realidade da vida, a outra trata do transcendental. E a Bíblia, que é um livro muito interessante de ser lido (principalmente Isaías), não procura ensinar à gente nada de ciência, e sim uma ordem moral. ... a Bíblia não quer ensinar como é que se fez o céu, mas quer ensinar como é que se vai ao céu. Trata-se de um preceito teológico muito importante, relativo à questão de graça: a pessoa acredita ou não. Agora, como eu respeito as pessoas que não creem, quero também que elas respeitem a sinceridade de minha fé." 
(Carlos Chagas Filho, 1910-2000, em entrevista concedida a Darcy F. de Almeida, e publicada em julho/agosto de 1983. https://www.freewebs.com/kienitz/declara.htm)

---------

A ciência como profissão: entrevista* com Carlos Chagas Filho”, História, Ciências, Saúde-Manguinhos, vol.19 no.2 Rio de Janeiro Apr./June 2012.

Em outra entrevista do dr. Carlos Chagas Filho, *concedida entre fevereiro de 1987 e setembro de 1988 a Nara Britto, Paulo Gadelha, Rose Ingrid Goldschmidt, o dr. Carlos Chagas Filho responde a algumas perguntas sobre "Ciência e Religião":

Seus pais eram católicos?
“Meu pai, eu nunca soube. Ele nunca se pronunciou, mas devia ter uma crença profunda... Minha avó paterna, essa sim, era religiosíssima.”

Os seus companheiros de instituto e da Faculdade de Medicina, eles aceitam a sua religião?
“Alguns talvez não aceitem, mas muitos são religiosos. Eu acho que a gente tem que respeitar as pessoas no que elas sentem, no que elas pensam e até mesmo no que elas fazem. A não ser quando o que elas fazem realmente contrarie uma lei natural.”

O que é a religião para o senhor?
“...Eu acredito tão piamente que há qualquer coisa acima de nós que essa coisa tem para mim uma configuração muito bem formada. Mas isso não significa que eu não seja um grande pecador.”

É comum a comunidade científica ser religiosa?
“Nos EUA, sim. Na França, durante muito tempo era impossível achar um bom cientista católico... Esse é um problema curioso, porque muitos cientistas escondem que são religiosos...”

Em que momento a ciência se encontra com a religião?
“Eu acho que a ciência começa a tropeçar quando chega naquilo que chamamos de causa primeira. Vejam um exemplo: primeiro, a ciência descobriu o átomo. Depois se verificou que o átomo é constituído por partículas elementares. Hoje, despedaçam-se essas partículas elementares em outras partículas elementares e por aí vai... Até que chega um momento em que nos deparamos com alguma coisa que foi a causa primeira. Filosoficamente, o cientista que é sincero e que quer ir até o fim com sua racionalidade percebe que chega uma hora em que não pode avançar mais. Então é muito mais fácil acreditar que houve um princípio. Esse é o momento em que a ciência se entremeia com a filosofia e daí com a teologia...”

Doutor Chagas, já estamos chegando ao final e gostaríamos de saber como o senhor conseguiu conciliar uma atividade internacional tão intensa com sua vida no Instituto de Biofísica. Porque o senhor sempre esteve presente aqui, mesmo com tantas atribuições lá fora.
Bem, há aí dois fatores. O primeiro deles é que eu tive sempre a minha mulher para me ajudar. Ela nunca me exigiu nada. O segundo fator é que o nome de meu pai me ajudou muito.

---------

Uma boa biografia do dr. Carlos Chagas Filho pode ser encontrada no Canal Ciência, ou no artigo:
Ciência, política e paixão: o arquivo de Carlos Chagas Filho”, História, Ciências, Saúde-Manguinhos, vol.12 no.1, Rio de Janeiro, Jan./Apr. 2005

Para resumir um pouco, o dr. Carlos Chagas Filho (1910-2000) é filho do dr. Carlos Ribeiro Justiniano das Chagas (1878-1934). O dr. Carlos Chagas (pai), em suas pesquisas desenvolvidas no Instituto Oswaldo Cruz, destacou-se ao descobrir o protozoário Trypanosoma cruzi (cujo nome foi uma homenagem ao seu amigo Oswaldo Cruz) e a tripanossomíase americana, conhecida como doença de Chagas. Ele foi o primeiro e até os dias atuais permanece o único cientista na história da medicina a descrever completamente uma doença infecciosa: o patógeno, o vetor, os hospedeiros, as manifestações clínicas e a epidemiologia.