"O primeiro homem, formado da terra, é terreno; o segundo homem é do céu" (1Co 15.47)
'A afirmação cristã realmente extraordinária é a de que Jesus de Nazaré era Deus tornado em homem – que a segunda pessoa da Divindade se tornou o “segundo homem” (1Co 15.47), determinando o destino humano, a segunda cabeça representativa da raça, e que ele assumiu a humanidade sem perda da divindade, a fim de que Jesus de Nazaré fosse verdadeira e plenamente divino assim como era humano. Aqui há dois mistérios pelo preço de um – a pluralidade de pessoas dentro da unidade de Deus e a união da Divindade e da humanidade na pessoa de Jesus. É aqui, no acontecimento ocorrido no primeiro Natal, que estão as mais insondáveis profundezas da revelação cristã. “O Verbo se fez carne” (Jo 1.14); Deus se tornou homem; o Filho divino se tornou um judeu; o Poderoso apareceu na terra como um frágil bebê humano, incapaz de fazer mais do que ficar deitado, olhar, mexer-se e fazer ruídos, tendo a necessidade de ser alimentado, trocado e ensinado a falar como qualquer outra criança. E não havia nenhuma ilusão ou engano nisto: a primeira infância do Filho de Deus era uma realidade. Quanto mais você pensa nisso, mais extraordinário isso se torna. Nada na ficção é tão fantástico quanto esta verdade da encarnação.'
'QUEM É ESSA CRIANÇA? Os evangelhos de Mateus e Lucas nos contam em detalhes como o Filho de Deus veio a este mundo. Ele nasceu do lado de fora de um pequeno hotel em uma obscura vila judaica nos grandes dias do império romano. A história é geralmente embelezada quando a contamos de Natal em Natal, mas, na realidade, é desagradável e cruel. A razão pela qual Jesus nasceu do lado de fora é porque o hotel estava cheio e ninguém queria oferecer uma cama para uma mulher em trabalho de parto, de modo que ela teve de dar à luz em um estábulo e colocar o bebê num cocho de animais. A história é contada sem paixão e sem comentário, mas nenhum leitor consciencioso deixará de se arrepiar com a imagem de indiferença e degradação que ela representa.'
'É como Filho de Deus que ele apresenta Jesus por todo o Evangelho. Entretanto, João sabia que a expressão “Filho de Deus” estava contaminada com associações enganosas na mente de seus leitores ["ao que parece, tanto para leitores de contexto judeu quanto grego"]. A teologia judaica a usava como um título para o Messias (humano) esperado. A mitologia grega chamava a muitos de “filhos de deuses”, super-homens nascidos da união entre um deus e uma mulher humana. Em nenhum destes casos a expressão transmite o pensamento de divindade pessoal; em ambos, de fato, ela está excluída.'
'Ele [Evangelho segundo João] não traz o termo "Filho" nas suas sentenças iniciais; em lugar disso, ele fala primeiro do Verbo. Não havia perigo de que isso fosse mal compreendido; os leitores do Antigo Testamento perceberiam a referência desde o primeiro momento. O Verbo de Deus no Antigo Testamento é a sua força criativa, seu poder em ação cumprindo seu propósito. O Antigo Testamento retrata a expressão de Deus, a afirmação real de seu propósito, como tendo poder em si para realizar aquilo a que se propôs. Gênesis 1 nos diz como, na criação, "Deus disse: Haja... e houve..." (Gn 1.3). "Os céus por sua palavra se fizeram... Pois ele falou, e tudo se fez" (Sl 33.6,9). O Verbo de Deus é, portanto, Deus em ação. João usa essa figura para nos contar sete (7) coisas acerca do Verbo divino.'
'O mistério da encarnação é insondável. Não podemos explicá-lo, apenas formulá-lo. Talvez nunca tenha sido melhor formulado do que nas palavras do Credo Atanasiano: “Nosso Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, é Deus e homem... perfeito Deus e perfeito homem... que, embora seja Deus e homem, ainda assim não é dois, mas um só Cristo; um não por conversão da Divindade em carne, mas porque Deus assumiu a natureza humana”. Nossa mente não pode ir além disso. O que vemos na manjedoura é, nas palavras de Charles Wesley: "Nosso Deus reduzido a um palmo... Incompreensivelmente tornado homem". Incompreensivelmente – seremos sábios se nos lembrarmos disso, para evitar a especulação e adorar alegremente.'
'Algumas vezes, teólogos têm brincado com a ideia de que a encarnação tenha tido original e basicamente o propósito de aperfeiçoar a ordem criada e que seu significado redentivo foi, por assim dizer, uma decisão posterior de Deus; mas como James Denney corretamente insistiu, “o Novo Testamento não diz nada acerca de uma encarnação que possa ser definida sem a sua relação com a expiação... Não foi Belém, mas o Calvário, o foco da revelação, e qualquer construção de Cristianismo que ignore ou negue isto estará distorcendo o Cristianismo, ao colocá-lo fora de foco” (The Death of Christ, 1902, p. 235). O significado crucial do berço em Belém está em seu lugar na sequência dos passos descendentes que levaram o Filho de Deus até a cruz do Calvário, e nós não o entendemos até vê-lo dentro de seu contexto.'
(Trechos do livro "O conhecimento de Deus", de J.I. Packer, particularmente no capítulo 5, "Deus encarnado")
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"Um dom inefável" (Stephen Yuille)
"O Infinito tornou-se finito. O Criador se tornou uma criatura. Ele (que fez todas as coisas a partir do nada) nasceu de uma mulher. Ele (a quem os céus não podem conter) estava contido no pequeno útero de uma mulher. O pão da vida estava com fome. A água da vida estava com sede. O maior descanso estava cansado. A maior alegria estava triste. A maior fúria e o maior favor se encontraram na cruz. O maior ódio e o maior amor se manifestaram na cruz. Infinita justiça foi satisfeita e infinita misericórdia foi garantida na cruz. Estamos enriquecidos por Sua pobreza, preenchidos por Seu vazio, exaltados por Sua desgraça, curados por Suas feridas, confortados por Sua dor, e justificados por Sua condenação.
'Graças a Deus pelo seu dom inefável!' (2Co 9:15)"
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