"A verdade, aqui, é que o Deus sobre quem se havia dito: 'Como pastor, apascentará o seu rebanho; entre os seus braços recolherá os cordeirinhos' (Isaías 40:11) é muito gentil com cristãos muito novos, assim como as mães o são com bebês muito pequenos. Muitas vezes, o início de sua carreira [jornada] cristã é marcado por grande alegria emocional; providências marcantes, notáveis respostas às orações e frutos imediatos de seus primeiros testemunhos; desta forma, Deus os encoraja e os estabelece na 'vida' [cristã]. Mas, assim que crescem e são capazes de suportar mais, ele os exercita numa escola mais difícil. Ele os expõe a muitos testes de pressão por influências opostas e desanimadoras, na medida em que são capazes de suportar - não mais (veja a promessa em 1Coríntios 10:13), mas também não menos (veja a admoestação em Atos 14:22). Assim, ele constrói o nosso caráter, fortalece nossa fé e nos prepara para ajudar [servir] outros. Desta maneira, ele cristaliza nosso senso de valores. É desta forma que ele é glorificado em nossa vida, tornando sua força perfeita em nossa fraqueza."
"... Deus, que privou deles [crentes sendo amadurecidos] o brilho despreocupado da infância espiritual [neófitos], com seus risos e sua passividade feliz, precisamente a fim de que [Deus] possa levá-los a uma experiência mais adulta e madura. Pais terrenos desfrutam de seus bebês, mas ficariam tristes, para se dizer o mínimo, se seus filhos crescidos quisessem ser bebês outra vez, e hesitariam em deixá-los agir como tais. É exatamente isso o que ocorre com nosso Pai celestial. Ele quer que cresçamos em Cristo e não que permaneçamos bebês em Cristo."
"O menor efeito ao se aceitar a solução proposta [permanecendo espiritualmente imaturos ou 'bebês em Cristo'] será impedir o desenvolvimento espiritual - o surgimento de uma geração de evangélicos adultos infantis, risonhos, irresponsáveis e egoístas. Os piores efeitos, entre os crentes sinceros e honestos, será a introspecção mórbida [tristeza ou melancolia], a histeria, a estafa mental e perda da fé, em qualquer grau, em sua forma evangélica."
"[Perdendo a graça de vista] O que, basicamente, está errado com este ensinamento [permanecendo espiritualmente imaturos]?... Ele erra quanto ao ensino do Novo Testamento sobre a santificação e a batalha cristã. Não entende o significado de crescimento na graça. Ele não compreende as ações do pecado que habita nele. Ele confunde a vida cristã na terra [pautada pela santificação] com a vida cristã como ela será no céu."
"[O Deus que restaura] Esta verdade tem muitas aplicações. Uma das mais surpreendentes é que Deus realmente usa nossos pecados e enganos para este fim [santificação]. Ele usa a disciplina educativa dos fracassos e erros com muita frequência. É impressionante ver quanto a Bíblia fala de pessoas piedosas cometendo erros e Deus as castigando por isso."
"Abraão, a quem foi prometido um filho, mas o qual teve de esperar por ele, perde a paciência, comete o erro de agir com providência amadora e gera Ismael - e tem que esperar por mais treze anos antes que Deus fale com ele novamente (Gênesis 16:16-17:1). Moisés comete o erro de tentar salvar o seu povo através de atos de autoafirmação, usando sua força, matando um egípcio, insistindo em resolver os problemas particulares dos israelitas para eles - e é banido por muitas décadas para o meio do deserto, para que perdesse a sua presunção. Davi comete uma série de erros - seduz Bate-Seba, conduz a morte de Urias, negligenciando sua família, e realiza o censo por uma questão de prestígio pessoal - e, em cada caso, é castigado amargamente. Jonas comete o erro de fugir do chamado de Deus - e acaba dentro de um grande peixe."
"Assim, poderíamos seguir em frente com exemplos, mas o ponto a destacar é que o erro humano e o imediato desagrado divino não foram, em nenhum dos casos, o fim da história. Abraão aprendeu a esperar o tempo de Deus. Moisés foi curado de seu convencimento (na verdade, sua desconfiança posterior em si mesmo foi quase pecaminosa - veja Êxodo 4:10-14). Davi achou arrependimento após cada uma de suas falhas e estava mais perto de Deus no final do que no início. Jonas orou do ventre do peixe e viveu para cumprir sua missão em Nínive."
"Deus pode fazer brotar o bem a partir dos extremos da nossa própria loucura [pecado]; Deus pode restaurar os anos que o gafanhoto devorou [ver o livro do profeta Joel]. Dizem que aqueles que nunca cometem erros nunca fazem nada; certamente esses homens cometeram erros, mas, através de seus erros, Deus lhes ensinou a conhecer sua graça e a se apegarem a ele de uma forma que nunca teria acontecido de outro modo. O problema é uma sensação de fracasso? O conhecimento de ter cometido algum erro medonho? Volte-se para Deus; sua graça restauradora espera por você."
"... Nós precisamos que Deus nos torne realistas tanto em relação a nós mesmos quanto em relação a ele. Talvez haja uma palavra para nós no famoso hino ['Eu pedi ao Senhor que eu pudesse crescer', 1779] em que John Newton descreve a passagem para o tipo de realismo que temos procurado induzir:"
Pedi ao Senhor que eu pudesse crescer
Na fé, no amor, e em toda a graça;
Para poder conhecer mais de sua salvação
E buscar mais fervorosamente a sua face.
Eu esperava que, em alguma hora favorável,
Imediatamente ele responderia ao meu pedido
E pelo poder constrangedor do seu amor,
Eliminasse meus pecados e me desse descanso.
Em vez disso, ele me fez sentir
Os males ocultos do meu coração;
E deixou os poderes irados do inferno
Assaltarem minha alma em cada lugar.
E ainda mais, com sua própria mão
Pareceu tentar agravar meu sofrimento;
Destruiu todos os projetos justos que idealizei,
Desmanchou meu jogo e me derrubou.
'Senhor, por que isto?' Com tremor clamei:
'Por que persegues um verme até a morte?'
'É desse modo', respondeu o Senhor,
'Que eu atendo as orações por graça e fé'.
'Estas provações internas que eu utilizo
É para te livrar do orgulho e do egoísmo;
E destruir teus esquemas de alegria terrena,
Para que possas buscar teu tudo em mim'.
[Tradução da poesia/hino I asked the Lord that I might grow, de John Newton, 1779]
(Trechos do livro "O conhecimento de Deus", de J.I. Packer, particularmente no capítulo 21, "Essas provações íntimas")